top of page

O que se comemora no Dia do Folclore?

Atualizado: 2 de fev. de 2021

A história e a importância do Dia do Folclore, comemorado em 22 de agosto

Imagem: Daniel Arantes

O ano é 1965, em plena Ditadura Militar, o presidente Castelo Branco assina o decreto instituindo 22 de agosto como o Dia do Folclore em todo território nacional. Paradoxalmente, pouco mais de um ano antes, em primeiro de abril, ainda no calor do golpe, o prédio da Comissão de Defesa do Folclore Brasileiro era fechado com um cartaz com os dizeres: “fechado por ser um antro de comunistas”. Conquistas de anos de estudos, sistematização e árdua articulação na defesa de patrimônios culturais nacionais foram brevemente paralisadas.


O dia 22 de agosto, que hoje é celebrado em diversos países, remonta a publicação, em 1846, da carta de autoria do arqueólogo inglês William John Thomas intitulada “Folk-lore” no periódico Athenaeum, uma revista literária semanal com ampla distribuição e especial influência durante período vitoriano na Inglaterra. Na carta o escritor, antiquário e bibliotecário da Câmara dos Lordes em Londres, Thomas, usando o pseudônimo Ambrose Merton, criou um neologismo na fusão dos termos folk que em inglês significa povo e lore que significa conhecimento, para o que até então vinha sendo definido insatisfatoriamente como "antiguidades populares". A carta já manifestava a ampliação que o termo representava no sentido de abarcar os diversos saberes e mitologias populares. Bem como revelava a necessidade da preservação dessas criações culturais uma vez que muito deste conhecimento é transmitido oralmente e sofre ameaças permanentes de mutação e deterioração. Depois de breve resistência inicial o termo ganhou espaço e foi amplamente adotado.


No Brasil, nossa formação étnica a partir dos índios da terra, do colonizador português, e dos africanos escravizados deu origem a um rico folclore plural, diversificado e regionalizado. As lendas, mitos, canções, crendices, adivinhas, fábulas e provérbios estão estritamente ligados à ocupação geográfica dos povos originários, aos ciclos econômicos de colonização e dominação portuguesa, e dos movimentos de resistência, assimilação e ressignificação dos povos escravizados. A dinâmica entre esses processos, povos e a geografia do país não é estática, o que ainda confere ao folclore nacional um caráter de fusão e construção permanente.


Desse caldeirão cultural surgiram personagens míticos difundidos pelo país e outros mais conhecidos regionalmente, tais como o Saci-Pererê, o Curupira, Boitatá, Mula-sem-cabeça, o Boto, a Iara e o Negrinho do Pastoreio. Experimentamos também uma incrível profusão de manifestações culturais que vão das Folias, Reisados, Congadas, Catiras, Bumba-meu-boi, Maracatu, Frevo ao Samba e as Festas Juninas. Não menos diversas são as várias crenças, superstições e jargões populares difundidas pelo país.


Imagem: Daniel Arantes

Os esforços para estudar o folclore brasileiro vêm sendo realizados desde o final do século XIX, embalados pelo movimento do Romantismo e suas tentativas de ressaltar elementos da cultura nacional. Entretanto os estudos sistemáticos só se consolidaram nas primeiras décadas do século XX, reforçados pelas influências ufanistas do movimento Modernista. Destacam-se a partir deste período pesquisadores como Mário de Andrade, Luís da Câmara Cascudo, Edison Carneiro, Florestan Fernandes e Gilberto Freyre.


Ao final da Segunda Guerra Mundial o folclore passou a ser visto com elemento de congregação dos povos, incentivando o respeito às diferenças e proporcionando a construção de identidades. Nesse contexto o movimento folclorista nacional conseguiu a influenciar na criação da Comissão Nacional de Folclore vinculada ao Ministério da Educação e à UNESCO em 1947.


Durante o I Congresso Brasileiro de Folclore em 1951 no Rio de Janeiro, que contou com a presença do então presidente Getúlio Vargas, foi gestado o documento que ficou conhecido como a Carta do Folclore Brasileiro, que definiu conceitos e tratava das recomendações de pesquisa, proteção e divulgação a respeito do folclore nacional. Desde então os estudos e sistematizações se ampliaram aprofundando debates antropológicos e sociais.

Imagem: Daniel Arantes

Atualmente, depois de muitos avanços e outros tantos reveses, o reconhecimento do direito da população praticar suas manifestações culturais, e a importância da difusão e preservação do folclore foi contemplado na Constituição Brasileira de 1988. Nada mais coerente, para aquela que ficou conhecida como Constituição Cidadã: fortalecer práticas culturais que ajudam a construir um senso de identidade e pertencimento, ao mesmo tempo em que promove o respeito à diversidade cultural. Entretanto, leis são convenções que podem ser facilmente contaminadas por lógicas políticas momentâneas e imediatistas, que são muito distintas da dinâmica real do verdadeiro folclore. Este costuma ter origem anônima, transmissão oral, popularização coletiva e surge espontaneamente. Ao contrário de datas comemorativas que podem ser criadas por decretos políticos.


...


Daniel Arantes Pereira, 43, é natural de Cássia, no Sul de Minas, e reside em São

João del Rei há 7 anos, onde estuda Comunicação Social - Jornalismo na UFSJ.

Cientista de alimentos e fotografo amador, é fascinado pelas tradições e

manifestações culturais do povo brasileiro. Através do Programa de Extensão “Por

Outro Olhar” encontrou oportunidade de partilhar seu ponto de vista sobre temas de

sua vivência.

Comments


receba as nossas atualizações no seu email

© 2022. Por Outro Olhar.

bottom of page