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Caroline Santos

Cidade de Deus e o cinema nacional

Mecanismo de denúncia ou visão artística sobre a violência?

Imagem: Cidade de Deus. Fernando Meirelles e Kátia Lund.

Há 18 anos estreava no Brasil um dos maiores expoentes da cinematografia nacional. O filme, que até hoje se consagra como o líder de indicações que uma produção brasileira recebeu no Óscar, a premiação mais famosa - para não dizer importante - da sétima arte.

Contando com uma trama que instiga, comove, revolta; e personagens nessa mesma linha, o filme desperta as mais diferentes emoções no público. É na direção, ou seja - no modo de contar a história - que Cidade de Deus se destaca ao oferecer uma autoralidade impressionante. O filme demonstra que o cinema brasileiro tem muita competência por trás da sua falta de investimento.


A obra, que retrata toda a violência das favelas cariocas nos anos 80 e a origem deste problema social ainda nos anos 60. É em grande parte uma denúncia sobre o descaso do governo com os habitantes dessas comunidades. Não se esquivando de mostrar o quão cruel pode ser uma vivência rodeada por tamanha brutalidade, o filme não alivia o telespectador nas cenas mais tensas. Em certas passagens, a câmera na mão lembra muito a estética documentarista, tal como os atores do longa que mesmo não profissionais, em sua maioria, faria nem com que o mais severo dos críticos desse uma nota menor que excelente. O modo de atuar extrai tanto realismo que nos questionamos se estamos vendo mesmo uma interpretação.


Contudo, apesar de conter fortes elementos realistas, Cidade de Deus não se trata de uma obra documental, nem nunca se propôs a isso e não deve ser encarada como tal. O filme busca mais do que evidenciar questões sociais relevantes, nele há o claro objetivo de criar uma obra que reúna os mais diversos componentes da linguagem cinematográfica. Deste modo tudo o que constrói o filme - as imagens, os sons, o enredo - são trabalhados para que haja uma trama consistente, e além, para que a mensagem que o realizador deseja passar seja recebida da forma correta pelo público. E podemos concordar que Fernando Meirelles fez tudo isso com maestria, ao apresentar um tema já tão conhecido por nós, através de noticiários, com um estilo que combina com o cinema.


Cidade de Deus já nasceu um clássico do cinema nacional, que vem anos sendo criticado por só saber retratar as nossas tragédias sociais. Este pensamento, que além de ser equivocado e ignorar boa parte do acervo de filmes nacionais, ainda dispõe da função de desdenhar das obras realizadas aqui e se esquece que ainda que o tema tratado seja o mesmo, sua abordagem pode ter muito mais a dizer. O filme de Fernando Meirelles é um exemplo claro disso. A história trata sobre a violência e descaso social, mas o longa vai muito além. Ao contar a trama de modo não linear, que a todo tempo muda o enfoque e cuja cada cena, seja ela frenética ou contemplativa, tem seu próprio toque de autoralidade. Deste modo Cidade de Deus é apenas uma amostra de como o cinema nacional busca mais do que denunciar tragédias sociais. Ele vai além, ele procura fazer arte. E não falha nisso.


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Paulistana e estudante de jornalismo na UFSJ, Caroline Santos é fascinada por imagens, estáticas ou móveis, mas encontra na escrita sua verdadeira paixão. Sempre em busca de fugir do senso comum, acredita que o Por Outro Olhar é o projeto perfeito para isso.

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